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Pais britânicos criam “espaços calmos” em casa para ajudar crianças ansiosas a concentrarem-se, segundo psicólogos.

Pai e filho sentados na sala, brincam com um brinquedo colorido; ambiente acolhedor com sofá, mesa e candeeiro.

Os pais estão a criar pequenos “cantos tranquilos” para que crianças ansiosas possam respirar, reajustar-se e realmente fazer os trabalhos de casa. Os psicólogos estão atentos.

A chaleira desliga-se mesmo quando a Ellie puxa uma manta polar sobre as costas de duas cadeiras de jantar. Ela coloca um puff por baixo, desliza uma caixa de lápis de cera e um livro gasto de tabuadas, e regula umas luzes de fada para um âmbar suave. No silêncio de um apartamento no Sul de Londres, o trânsito transforma-se num zumbido distante e um menino de nove anos expira como se tivesse estado a prender a respiração o dia todo.

Ele esgueira-se para dentro do pequeno recanto com as meias meio-calçadas, faz uma festa ao gato e começa a desenhar números com o dedo no tapete. Naquela luz suave, os ombros relaxam e as extremidades do quarto parecem mais acolhedoras. Finalmente, os exercícios de matemática ficam feitos.

Começou com uma manta.

O crescimento do canto tranquilo em casa

Fale com pais à porta da escola e ouve sempre o mesmo: o barulho segue os miúdos para todo o lado. Salas de aula em open space, clubes extracurriculares cheios, ecrãs a emitir notificações que nunca param. Por isso, os pais estão a construir cantos tranquilos em casa, não como projetos do Pinterest, mas como micro-santuários práticos.

Raramente é uma sala sensorial completa. Muitas vezes é um recanto atrás de uma estante, uma tenda num canto de um quarto partilhado, um espaço entre o roupeiro e a parede que nunca teve utilidade. O objetivo é simples: menos estímulos, mais segurança. Um local onde corpos ansiosos possam encolher o mundo só o suficiente para se concentrarem.

Em Leeds, o Tom percebeu que a filha lia mais depressa quando se sentava debaixo das escadas, com um candeeiro e um tapete macio. Em Bristol, a Aisha colou cartão num velho candeeiro de mesa para tornar a luz mais quente e juntou um pequeno cesto de brinquedos anti-stress ao lado das folhas dos SATs do filho. Por toda a Inglaterra, inquéritos dos últimos anos sugerem que cerca de uma em cada seis crianças deverá ter uma dificuldade de saúde mental, e os serviços do NHS reportam números recorde de encaminhamentos para consultas de saúde mental infantil (CAMHS).

Os pais sentem essa pressão à noite, quando ruído e preocupação se misturam. O canto tranquilo tornou-se uma pequena resposta para um grande problema. Não é uma cura. É uma ferramenta para lidar.

Porque é que um pedaço de tapete muda o foco de uma criança? A previsibilidade acalma o sistema nervoso. Quando o cérebro tem menos sons, menos cores e um limite claro, há menos para combater. Um espaço pequeno e fechado incentiva o corpo ao “descanso e digestão” em vez de “luta ou fuga”.

Os psicólogos descrevem-no como regulação externalizada: pede-se emprestado calma ao ambiente até que o cérebro consiga fornecê-la sozinho. Uma luz constante, uma almofada familiar, uma rotina conhecida. Rituais constantes reduzem a carga mental e libertam a atenção para ler, escrever, ou simplesmente estar bem.

Como construir um que realmente ajude

Comece pela localização. Escolha um local longe do barulho dos pratos ou das zonas de passagem, mesmo que só tenha um metro de largura. Reduza a luz com uma lâmpada quente ou um regulador barato. Adicione um assento confortável, uma textura suave, e uma forma de “fazer” silêncio: um bloco de desenho, um cartão com exercícios de respiração ou uma ampulheta.

Mantenha-o portátil se o espaço for apertado. Um biombo dobrável, uma tenda pop-up ou até uma cortina num varão de pressão podem transformar um canto num casulo. Uma regra simples funciona: um assento, uma luz, um cesto. Esse é o seu kit de calma.

Um erro comum é encher o recanto de gadgets. O canto deve parecer uma expiração, não uma loja de brinquedos. Outro erro é usá-lo como castigo. Se for uma “escada dos malandros”, as crianças evitam-no precisamente quando mais precisam dele.

Todos conhecemos aquele momento em que se avizinha um colapso e tentamos tudo. Convide, não obrigue. Sente-se lá com eles uma ou duas vezes, para que o espaço seja um local de calma partilhada, não um exílio solitário. Sejamos honestos: ninguém faz isto todos os dias.

“Pense num canto tranquilo como uma ponte para o foco, não como a viagem toda. Quando uma criança o escolhe, está a ensinar-se autorregulação e autorrespeito ao mesmo tempo.”
  • Luz quente: candeeiro ou luzes de fada, não luz de teto forte.
  • Base macia: tapete, puff, edredão ou manta dobrada.
  • Ferramentas de ancoragem: colar de mastigar, bola anti-stress, seixo liso.
  • Ajudas à concentração: ampulheta, lista de verificação simples, livro favorito.
  • Ponto de conforto: fotografia, planta pequena ou um aroma seguro em algodão.

Para lá do canto: o que pensam os psicólogos

Muitos psicólogos infantis veem os cantos tranquilos como uma forma prática de reduzir a carga sensorial e dar ao cérebro uma “linha de partida” previsível. Aplaudem a ideia quando é guiada pela criança e combinada com estratégias de regulação: respiração box, scan corporal, pausas curtas de movimento. Chame-lhe canto, não clínica.

Há precauções. O canto não deve tornar-se fuga constante a qualquer desafio. Evitar demasiado pode fazer crescer as preocupações escolares. O ideal é uso breve e frequente, seguido de regresso suave à tarefa ou ao convívio.

Lembram também os pais de observar o dia à volta do canto. Alimentação, sono, ecrãs e o stress escolar chegam à noite. Um canto não resolve a ansiedade dos domingos nem um horário sobrecarregado, mas pode tornar os primeiros cinco minutos possíveis. E cinco minutos desbloqueiam, muitas vezes, outros dez.

O que se destaca é o ar comum destes espaços. Uma poltrona estreita sob uma janela. Uma tenda com vara meio torta. Fita num LED demasiado brilhante. As famílias fazem “design” com o que têm — e na maioria das vezes resulta.

Num apartamento arrendado em Newcastle, uma mãe usou uma cortina removível e uma lanterna a pilhas. Numa casa geminada em Leicester, um pai transformou o lado de um roupeiro numa “parede de respiração” com quatro quadrados desenhados à mão: desenhar e respirar. Pequenos truques, grande alívio.

Nada disto substitui terapia ou apoio escolar quando são necessários. Mas o canto pode evitar batalhas com os trabalhos de casa e tornar a hora de ir para a cama menos dramática. É a favor da lentidão numa casa que nunca para.

Os psicólogos também sublinham a importância da consistência acima da complexidade. Um ritual de dois minutos chega: sentar, beber água, três respirações, escolher uma tarefa. As crianças aprendem que a calma é uma sequência, não um estado de humor. E sequências, praticam-se — mesmo em dias agitados.

Algumas famílias dão nome ao canto para que pareça escolhido: “A Toca”, “Espaço Nuvem”, “O Farol.” Os nomes são importantes para as crianças. Um nome faz a segurança ficar.

Para crianças neurodivergentes, a previsibilidade é muitas vezes a porta de entrada para a confiança. Para crianças ansiosas, o controlo do ambiente suaviza picos de pânico. O resultado partilhado é prontidão. Prontidão para ler, recuperar, ou voltar ao ruído quando quiserem.

Como é que isso se traduz numa noite de terça-feira? Uma criança de sete anos senta-se três minutos debaixo da manta, observa a areia cair, depois fecha a página da leitura com um sorriso que ontem não estava lá. Um adolescente recolhe-se numa cadeira junto ao patamar, auscultadores canceladores de ruído nos ouvidos, ouve sons de chuva, volta ao estudo de Química com menos tensão na mandíbula.

Isto não são milagres. São pequenas vitórias, empilhadas como pratos quentes, numa cozinha que finalmente parece acolhedora.

Sim, há semanas em que o canto ganha pó. A energia baixa, a vida acontece, as rotinas falham. É a vida. O recanto espera, pronto para a próxima tentativa.

Os pais dizem-me que a grande mudança não é ter filhos mais calmos. É uma casa mais calma. As vozes baixam um tom. As discussões perdem arestas. O canto ensina a todos o que é sentir estabilidade — até adultos que não sabiam precisar.

Talvez seja este o poder secreto escondido à vista de todos. Quando uma família constrói um espaço onde a criança pode reajustar-se, toda a casa aprende uma nova forma de recomeçar. A luz acende-se. A respiração abranda. O dia suaviza nas margens.

Nada disto exige grande orçamento ou uma divisão extra. Um lençol preso a duas cadeiras chega. Um bloco com três linhas: “Respirar. Começar. Pausa.” O objetivo não é a perfeição. É permissão.

Se um canto já floresce em sua casa, partilhe-o. Se não, tente hoje uma versão de dois elementos: uma coisa macia, uma luz suave. Veja o que muda quando o mundo fica um pouco mais pequeno de propósito. Pode surpreender-se com o que cresce.

Ponto chaveDetalheInteresse para o leitor
Comece pequenoUm assento, uma luz quente, um cestoFácil de montar hoje sem gastar muito
Deixe ser a criança a liderarDeixe que escolha um nome e dois objetosAumenta o envolvimento e o uso real em momentos de stress
Use rotinas curtas2–5 minutos com ampulheta e respiraçãoAumenta a concentração sem virar luta de poder

Perguntas Frequentes:

  • E se não tiver espaço? Crie um canto portátil: um biombo dobrável ou uma manta sobre duas cadeiras, mais um cesto portátil.
  • O meu filho não o usa. E agora? Utilizem juntos. Sentem-se lá primeiro, leiam ou desenhem, e deixem o espaço tornar-se seguro antes de pedir que tente sozinho.
  • Quanto tempo deve uma criança ficar no canto? Curto é suficiente. Dois a cinco minutos, depois regresso suave à tarefa ou atividade em família.
  • Isto substitui terapia ou apoio escolar? Não. É um apoio caseiro que pode complementar ajuda profissional e estratégias escolares.
  • E se a criança começar a evitar os trabalhos de casa “vivendo” no canto? Defina limites claros: o canto serve para acalmar, depois faz-se um pequeno passo de trabalho. Calma primeiro, ação depois.

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